A impunidade nunca vai acabar no Brasil

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

É engraçado esta gente que pensa que a punição irá moralizar o Brasil. Em certos casos pode ser que ate diminua a criminalidade. Em outros, além da criminalidade não diminuir, com certeza ela vai aumentar. Mesmo porque, o bandido pobre é punido desde que nasce, ser pobre no Brasil é uma das piores punições do universo, totalmente injusta porque não se cometeu nenhum crime. É por excesso de punição o bandido pobre se torna bandido. No caso do bandido rico, ai sim, verdadeiramente existe impunidade, porque além dos milhões de privilégios que os ricos têm, eles podem cometer qualquer crime que nunca irão ser presos, e por saber disto o bandido rico comete crimes.

Quando o bandido pobre se torna bandido é pra afrontar a sociedade, se vingar dos crimes hediondos que a sociedade cometeu contra o bandido pobre; a motivação do bandido pobre é o ódio, o desejo de inserção social, a falta de perspectivas... No caso do bandido rico eles cometem crimes por puro egoísmo ou por “brincadeira”, eles adoram colocar fogo em mendigos, porque eles estão acima da lei e podem fazer qualquer coisa, eles detêm o poder e quem detêm o poder pode cometer qualquer atrocidades.

É obvio que o bandido pobre não tem medo da punição. Nenhum tipo de punição irá frear o ódio que o bandido pobre tem contra a sociedade. Muito pelo contrário, a punição contra o bandido pobre é necessária para que ele justifique os seus crimes. Para provar pra ele mesmo que a sociedade é um monstro cruel e desumano. Que trata com desumanidade os revoltosos, e os bandidos pobres se sentem iguais a esta sociedade. Se os bandidos pobres fossem bem tratados a idéia que a sociedade é um monstro seria desmentida, e ai sim, o bandido pobre ficaria arrependido. Quanto mais violentamente o bandido pobre for tratado mais motivações ele terá para odiar a sociedade.

No caso do bandido rico é o inverso. Ele aprendeu desde cedo que é um rei, um pequeno imperador mimado que pode tratar o seu subordinado como um escravo, e se transforma num grande ditador. Ele nunca aprendeu a respeitar o outro, principalmente os inferiorizados, e trata o outro como se ele fosse um objeto, uma coisa... Daí vem a necessidade de eliminar o outro e a vê-lo como se ele não tivesse nenhuma importância, ele se torna um monstro egoísta que só pensa em si mesmo, e tem o direito social, de matar qualquer um que atravesse o seu caminho. E por quê? Por excessos de privilégios e ausência de “punição”. Ou seja, a punição contra o bandido pobre o torna criminoso e a ausência de punição contra o bandido rico o torna criminoso. Se o bandido rico fosse punido severamente ele entenderia que não é um Deus e não pode fazer qualquer coisa contra o outro.

E na sociedade acontece o contrario, ela quer que o pobre seja punido, mesmo sabendo que ele foi punido desde cedo, e quer que o rico passe incólume apesar dos imensos privilégios que ele sempre teve. A justiça só é obedecida e respeitada por todos quando há igualdade, quando não há igualdade cada um faz a sua lei seguindo os seus interesses particulares. O rico, por ser rico, pensa que esta acima da lei e pode fazer qualquer coisa; o pobre, por ser pobre, sente-se injustiçado e achasse no direito de afrontar a sociedade. Tanto ricos e pobres se tornam bandidos por causa da desigualdade social, por motivos antagonicamente diferentes.

Agora eles dizem, os donos da mídia, a alta classe media, os ricos, vamos acabar com a impunidade. E o bandido pobre (nem todo pobre se torna bandido por ser pobre, mas todo bandido pobre se tornou bandido por ser pobre) não tem medo da punição. Ele viu na criminalidade a única maneira de se tornar alguém, de ter algum sentido na vida, de não ser um assalariado ganhando pouco como o seu pai, a criminalidade abre perspectiva e ele pode expressar todo o ódio que sente pela sociedade. Tanto faz para ele morrer ou viver, as duas coisas para ele são a mesma coisa. Porque socialmente ele já esta morto e já perdeu totalmente a dignidade. Ele não tem nada a perder, nem a própria vida que ele não da valor. É a hora da desforra e depois a morte. Porque este é o destino que todo o bandido sabe que vai ter, é um caminho sem volta. Ou ele é morto pelos seus companheiros, ou pelos rivais, ou pelos policiais, ou acaba preso. E mesmo sabendo disto ele é criminoso. Se tivesse medo da punição ou da morte ele nunca seria bandido. Mas eles nunca terão medo nem da punição, nem da morte, porque eles já estavam mortos, a sociedade já os matou.

Outra coisa engraçada é o valor que as pessoas dão à vida e a relação disto com a impunidade. Quando um bandido pobre mata um rico, que por ser rico é valorizado pela sociedade, a sociedade quer punição imediata. Mas qual é o valor da vida quando um pobre é morto brutalmente? A sociedade se mobiliza para punir o criminoso que matou um pobre? Ou seja, para a sociedade capitalista a vida das pessoas tem valores diferentes. O rico e incluído e altamente valorizado e o pobre é ignorado e desprezado. Como vai se acabar com a impunidade quando a sociedade só quer punir o criminoso quando ele mata um rico? E como se a sociedade estivesse dizendo: “Pode matar quantos pobres vocês quiser que não será punido”. E um bandido que matou um pobre hoje, e não é punido por matar um pobre, amanhã poderá matar um rico. Ou seja, se o crime contra o pobre fosse apurado e punido o rico poderia estar vivo. Portanto, a sociedade diz: “vamos acabar com a impunidade”, logicamente, não quer acabar com a impunidade. Porque ela dá valores diferentes a vida das pessoas. E estas mesmas pessoas que querem o fim da “impunidade”, dizem: “A vida das pessoas não são valorizadas”. Com certeza, quando a “vida” de uma pessoa morta na favela tiver a mesma repercussão que a morte de um rico, ai sim, a vida, realmente, onde quer que ela esteja e em que classe social estiver, será valorizada.

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